Publicado em 17/05/2025
Resumo:
Este estudo de caso investiga as perdas de materiais em uma obra de linha de transmissão com fundação tipo tubulão, construída em solo com baixa coesão. Inicialmente, o projeto previa um volume de 22.000 m³ de concreto, com uma perda estimada de 15%. No entanto, ao longo da execução da obra, a perda real observada foi significativamente maior, alcançando 25%. O aumento das perdas foi atribuído a fatores geotécnicos, como o solo instável e a presença de pedras. Além disso, identificaram-se perdas adicionais em materiais como brita, areia e cimento devido à alta umidade da areia, contaminação de brita e areia no depósito e perda de cimento durante a operação. O estudo propõe estratégias para mitigar essas perdas e apresenta uma fórmula aprimorada para o cálculo de agregados, visando proporcionar indicadores mais seguros e precisos para orçamentos de obras desse tipo.
Palavras-chave: orçamento; indicadores; linha de transmissão; perdas de concreto; tubulão
1. Introdução
O Sistema Integrado Nacional (SIN) está passando por uma expansão da matriz energética impulsionada pelo crescimento de fontes geradoras no Nordeste e pelo aumento da demanda nas demais regiões do Brasil. Segundo a Empresa de Pesquisa
Energética (EPE), o consumo de energia no país deve crescer 80% até 2034, impulsionado sobretudo pelo avanço de grandes consumidoras, como data centers, aplicações em inteligência artificial e projetos de hidrogênio (EPE, 2024). De acordo
com ONS (2024), a 1ª Revisão Quadrimestral das Previsões de Carga para 2025- 2029 projeta um crescimento médio de 3,4% da carga no Sistema Interligado Nacional (SIN); e que em 2025, estima-se um aumento de 3,7%, chegando a 82.871 MW médios, com previsão de 94.573 MW médios em 2029. Esses dados consideraram a Micro e Minigeração Distribuída (MMGD) e a integração do estado de Roraima ao SIN a partir de janeiro de 2026. Neste cenário de crescimento e aumento, também, na demanda de construções, é importante lembrar que a execução de obras de infraestrutura, especialmente no setor de energia, costuma enfrentar desafios técnicos e econômicos que podem gerar perdas orçamentárias significativas. Segundo Rosa (2001), Skoyles (1974) considera inviável tratar todos os tipos de perdas em função da diversidade de materiais, tipos construtivos e particularidades das edificações; ele sugere que a investigação comece por um estudo piloto, objetivando identificar os materiais cujas perdas sejam mais relevantes em função da quantidade utilizada e desperdiçada.
Este trabalho tem como objetivo apresentar um estudo de caso sobre as perdas orçamentárias ocorridas durante a execução das fundações em uma linha de transmissão, tendo como fito principal as fundações do tipo tubulão realizadas em solos com baixa coesão. A escolha do tema também se justifica pela crescente demanda por construções de linhas de transmissão de energia elétrica e pelas recorrentes perdas de agregados associadas às etapas de escavação, estocagem e transporte de materiais para a produção do concreto, o que dificulta a consolidação de índices precisos que representem as perdas reais.
2. Desenvolvimento
Este estudo de caso foi realizado em uma obra de linha de transmissão de energia elétrica de 500 kV, com extensão aproximada de 470 km, apoiada por seis canteiros de obras distribuídos ao longo do seu trecho, na região Sudeste do Brasil, caracterizada por relevo acidentado e solos com baixa coesão.
Durante a construção, foram observadas discrepâncias além das normalmente previstas na etapa de orçamento, entre o volume de concreto projetado (e o efetivamente aplicado na obra. Isso gerou a necessidade de uma compreensão mais aprofundada, especialmente por se tratar de um projeto de construção de linha de transmissão de energia elétrica. Segundo Grohmann (1998, apud Lima, 2020, p. 11), o desperdício com materiais e mão-de-obra em uma construção pode chegar perto de
1/3 de seu valor final, ou seja, o setor, apesar dos investimentos que vem tendo nos últimos anos, ainda possui índices negativos consideráveis.
As primeiras verificações na obra apresentaram divergências relevantes entre o volume de material projetado para as fundações e o real aplicado, gerando perdas substanciais. A análise das causas revelou variações não previstas na geometria das fundações, escavações irregulares e comportamento inesperado do solo, que cooperaram para o aumento no consumo de concreto. Intervenções como a substituição de brocas, máquinas e revisão dos processos operacionais, não apresentaram resultados que justificassem o desvio percentual da perda constatada no controle executivo. Inicialmente, as perdas haviam sido estimadas em 15%; após início das atividades constatou-se que a perda real chegara aos 25%, demonstrando se tratar de um desvio de grande relevância para o projeto e futuros orçamentos. Além das perdas de concreto, verificou-se um aumento nas perdas dos agregados graúdos e miúdos. Durante o processo de carregamento na área de estoque, foi observado que parte dos agregados haviam penetrado no solo e outra sofrido contaminação; no tocante a perda de agregados, a solução adotada em estruturas, não itinerantes – que não é o caso da linha de transmissão, é a concretagem do piso. A soma do penetrado mais o contaminado representa aproximadamente 10%. Além disso a areia comprada apresentou um nível elevado de umidade, o que causou perda adicional de mais 10% no transporte entre a fábrica e o canteiro de obras. Somado a isso, houve uma perda de aproximadamente 5% de cimento devido a erros acumulados na dosagem do traço. Esses fatores contribuíram para um aumento substancial no custo da obra. Os materiais haviam sido orçados com base no volume de projeto (22.000 m³), acrescido de 15% de perda; no entanto, ao considerar as perdas reais, o custo total da obra sofreu um acréscimo não previsto.
Segue abaixo (tabelas 01 e 02) um comparativo entre a quantidade normalmente utilizada e a quantidade real utilizada na obra.
Tabela 01 – Quantidades orçadas (perda estimada em 15%)
Item | Insumos | Und. | Quant. | P. Unitário | P. Total |
1.0 | Concreto Projetado | m³ | 22000 | – | – |
1.1 | Concreto Projetado + 15% | m³ | 25300 | – | – |
1.1.1 | Brita 1 | Ton | 20240 | R$ 240,00 | R$ 4.857.600,00 |
1.1.2 | Areia Grossa | Ton | 21505 | R$ 220,00 | R$ 4.731.100,00 |
1.1.3 | Cimento CPIV | Ton | 10120 | R$ 700,00 | R$ 7.084.000,00 |
Total | R$ 16.672.700,00 |
Fonte: autor, 2025.
Tabela 02 – Quantidades orçadas mais perdas no processo de concretagem (total de perdas de 25%)
Item | Insumos | Und. | Quant. | P. Unitário | P. Total | ||
1.0 | Concreto Projetado | m³ | 22000 | – | – | ||
1.1 | Concreto Projetado + 25% | m³ | 27500 | – | – | ||
1.1.1 | Brita 1 | Ton | 22000 | R$ 240,00 | R$ 5.280.000,00 | ||
1.1.2 | Areia Grossa | Ton | 23375 | R$ 220,00 | R$ 5.142.500,00 | ||
1.1.3 | Cimento CPIV | Ton | 11000 | R$ 700,00 | R$ 7.700.000,00 | ||
Total (considerando a perda de concreto) | R$ 18.122.500,00 | ||||||
Correção com acréscimo de perdas de brita, areia e cimento | |||||||
1.1.1 | Brita 1 (+10%) | Ton | 24200 | R$ 240,00 | R$ 5.808.000,00 | ||
1.1.2 | Areia Grossa (+20%) | Ton | 28050 | R$ 220,00 | R$ 6.171.000,00 | ||
1.1.3 | Cimento CPIV (+5%) | Ton | 11550 | R$ 700,00 | R$ 8.085.000,00 | ||
Total (considerando perda de concreto e agregados) | R$ 20.064.000,00 | ||||||
Fonte: autor, 2025.
As observações, intervenções e levantamentos realizados durante o estudo, revelaram, como principal causa das perdas, as características geotécnicas do solo, tais como: baixa coesão entre partículas e presença de pedregulhos; observou-se que durante a escavação, elas promovem o surgimento de covas para além da face lateral da cava, gerando aumento do perímetro e consequente acréscimo no volume de concreto necessário ao preenchimento do espaço escavado.
Este estudo demonstra a relevância dos serviços de escavações – para concreto de fundações – em solos de baixa coesão, nas perdas financeiras associadas a este tipo de obra e apresenta um percentual de perda que pode ser usado como ponto de partida para amenizar, ou até evitar, desvios orçamentários em obras futuras com características similares.
3. Conclusão
Este estudo de caso demonstrou que, para obras de linha de transmissão com fundações em tubulão em solos fracos ou com pedras, é essencial considerar uma perda de aproximadamente 25% no volume de concreto, superando a previsão convencional de 15%. Além disso, quando o concreto é usinado diretamente no canteiro de obras, é necessário considerar um acréscimo de 10% no volume de brita, 20% no volume de areia e 5% no volume de cimento.
As perdas observadas não estavam relacionadas apenas ao processo de escavação, mas também a fatores como a qualidade do solo (por isso é crucial realizar a sondagem), a umidade da areia e a contaminação dos agregados no depósito, além de erros operacionais na usina de concreto. Para mitigar essas perdas, as seguintes medidas são recomendadas:
- Escavação com brocas novas e monitoramento constante das folgas de encaixe das brocas com a haste da perfuratriz. Além disso, é importante verificar sempre o diâmetro das brocas.
- Negociar com os fornecedores de areia em relação à umidade, propondo descontos baseados na quantidade de água presente. Uma solução é pesar a areia na saída e na chegada ao canteiro de obras para verificar a perda real.
- Verificação contínua dos volumes de concreto, garantindo que o traço para 1 m³ de concreto resulte, na prática, em 1000 litros de concreto.
- Treinamento, garantindo que as equipes de escavação, formas, usinagem de concreto e concretagem performe com eficiência e evite desperdícios.
- Quanto a contaminação e penetração dos agregados no solo, é recomendável uma adequação substancial no local de depósito, porém a viabilidade dessa medida está atrelada a um prazo maior de obra, o que não é comum em projetos de linhas de transmissão; contudo, pode-se estudar o custo entre a perda de agregados e a concretagem da área de depósito.
- Por fim, a fórmula para o cálculo dos agregados a serem utilizados em obras de linha de transmissão, levando em consideração as perdas, deve ser adaptada conforme as condições geotécnicas específicas de cada projeto. A fórmula proposta para concretagem de tubulões com baixa coesão é:
- Brita: (Volume de concreto projetado x 1,25) x (1,1 de perda no depósito)
- Areia: (Volume de concreto projetado x 1,25) x (1,2 de perda de depósito e umidade)
- Cimento: (Volume de concreto de projeto x 1,25) x (1,05 de perda na operação)
Com essas considerações, os orçamentos para concretagem de tubulões em solos considerados fracos em obras de linha de transmissão de energia elétrica, poderão ser mais precisos, evitando surpresas financeiras durante a execução do projeto. O dinamismo da obra, a variedade de materiais e as características das construções se apresentam como um desafio a ser superado na busca pelos índices reais de perda, entretanto prosseguir investigando os agrupamentos de materiais com maior impacto no orçamento, aumentam as chances de sucesso a curto prazo nessa busca.
4. Referências
EPE – EMPRESA DE PESQUISA ENERGÉTICA. Consumo industrial de energia deve crescer 80% até 2034, diz EPE. 2024. Disponível em: < EPE prevê aumento de 80% no consumo industrial de energia na década – Agência iNFRA>. Acesso em: 11 abr. 2025.
LIMA, Éderson de Oliveira. Os desperdícios na construção civil: a organização no canteiro de obras. 2020. Trabalho de Conclusão de Curso (Graduação em Engenharia Civil) – Centro Universitário Anhanguera, Leme – SP, 2020. Disponível em: < Ederson+de+Oliveira++Lima+TCC+II+Defesa.pdf>. Acesso em: 12 abr. 2025.
ONS – OPERADOR NACIONAL DO SISTEMA ELÉTRICO. ONS, CCEE e EPE divulgam revisão quadrimestral das previsões de carga para 2025-2029. 2024. Disponível em: <https://www.ons.org.br/paginas/noticias/details.aspx?i=11296>. Acesso em: 11 abr. 2025.
ROSA, Fabiana Pires. Perdas na construção civil: diretrizes e ferramentas para controle. 2001. 161 f. Dissertação (Mestrado em Engenharia Civil) – Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Porto Alegre, 2001. Disponível em: <Microsoft Word – Arquivo completo.doc>. Acesso em: 18 abr. 2025.
5. Apêndice
Imagem 01 – mapa mental
Sobre os autores:
Ismael Antônio Carvalho
Pablo Ilo Feliciano de Souza Lima
Yago Fernandes de Castro
Co Autor: Prof. Geraldo Melo
Editor Midias
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