Publicado em 20/08/2015
O que o livro “O Príncipe” nos ensina sobre fusões e aquisições? Por que muitos executivos são demitidos depois de uma fusão? Por que muitas fusões e aquisições não dão certo? A culpa é da cultura organizacional?
Quando escreveu “O Príncipe” em 1513, Nicolau Maquiavel tornou-se inadvertidamente no “enfant terrible” da política do poder, personificando o mal e a corrupção. Na verdade, Maquiavel não teve a intenção de legitimar a perversidade, pois ele simplesmente descreveu em detalhes como os governantes do século XVI aplicavam o poder, administravam suas propriedades, manipulavam e lideravam seus súditos. Ao revelar os segredos do poder, Maquiavel atraiu para si a fúria do rei prussiano Frederico II, o qual tentou bani-lo a qualquer custo.
Oficial do alto comando em Florença, Nicolau Maquiavel esteve sempre envolvido em assuntos domésticos e internacionais, sendo um mestre em descobrir o sustentáculo do poder, mesmo em situação política extremamente delicada.
Mas, quando a República Italiana entrou em colapso descobriu-se sem trabalho, preso e sob suspeita de conspiração. Dessa forma, ele escreveu “O Príncipe” durante sua prisão e, embora escrevesse sobre política de Estado, muito do que disse aplica-se até hoje às modernas corporações altamente politizadas e preocupadas com as fontes e aplicações do poder.
Maquiavel nos dizia que um Estado pode usar da força para coagir seus cidadãos a obedecer às leis, enquanto que as corporações lançam mão de sanções do poder como transferências, rebaixamentos ou demissões.
Seu livro – “O Príncipe” – foi escrito para instruir governantes sobre os usos e abusos do poder na gestão dos reinos, mas constitui-se também num guia clássico para as estratégias de fusões e aquisições, enfatizando a visão renascentista do indivíduo controlando de forma impiedosa a organização.
Na sua obra, Maquiavel não escreveu sobre como a vida “deveria ser”, mas, ao contrário, descreveu como os líderes de sucesso realmente trabalham. Sobre incorporações, Maquiavel recomenda que o antigo grupo administrativo seja despedido, quando a cultura das organizações (adquiridas e adquirentes) forem semelhantes. Isso pode parecer severo, mas, na verdade é o que ocorre em muitas organizações modernas.
Pesquisas demonstram que mais de 60% dos executivos seniores de empresas adquiridas, são demitidos no intervalo de três anos a partir da incorporação. O que aterrorizava os príncipes do século XVI (perda de posto e poder) é o que torna hostil a maioria das aquisições corporativas modernas. Não nos admiramos da defesa tão forte quanto ás muralhas que circulavam as cidades – Estados.
A segunda recomendação de Maquiavel foi a de conservar as condições preexistente, não se alterando leis nem impostos. Após a demissão da antiga administração, a empresa adquirente deveria agir vagarosamente nas mudanças ou interrompê-las por completo. Para adquirentes de empresas de culturas corporativas muito distintas, Maquiavel ofereceu três alternativas:
- Liquidar a adquirida.
- Deslocar o executivo-chefe para a nova dependência.
- Estabelecer um grupo administrativo de empregados leais e manter um relacionamento distante, de simples transferência dos lucros para a empresa-mãe.
Analisando as mais recentes estratégias de fusões e/ou aquisições de algumas empresas percebemos que essas organizações raramente vão mal, devido ao marketing praticado por ela ou à sua maneira de produzir – ou até mesmo às suas finanças.
De modo geral, seus líderes não conseguem enxergar o quanto as empresas adquiridas – ou fundidas – são completamente distintas de suas organizações e, muitas vezes, obrigam-nas a se “alinhar” aos seus padrões.
Dessa forma, temos observado que muitas aquisições e incorporações não funcionam como o planejado e algumas empresas até acabam quebrando completamente, pois uma organização pode ser dirigida pela pesquisa e a outra pelo marketing.
Ou uma pode ser inflexível e burocrática, ao passo que a outra se mostra informal e espontânea. Porém, mesmo que haja uma combinação quase perfeita os efeitos psíquicos desses casamentos arranjados podem ser brutais.
Observando a história da humanidade constatamos que Alexandre “O Grande” foi um dos melhor assimilou as incorporações, pois em 334 AC ele iniciou sua expedição contra a rica Pérsia e, bom planejador que era, Alexandre deixou a Macedônia – sua cidade natal – não apenas com um grande exército, mas também topógrafos, engenheiros, arquitetos, cientistas e com oficiais da corte e historiadores.
Conquistou a Ásia Menor, assaltou Tiro, foi recepcionado no Egito como o libertador e ali fundou Alexandria. Tomou a Babilônia e foi considerado o “Senhor da Ásia”. Em menos de 10 anos, Alexandre tornou-se soberano da metade do mundo conhecido, conseguindo conservar unido o império, menos pelo uso da força do que por meio de uma astuta política de assimilação. Os territórios persas recém adquiridos não foram obrigados a se “alinhar”; ao contrário, viram-se encorajados a conservar sua estrutura administrativa e cultural.
Aristóteles ensinou a Alexandre que somente os gregos eram homens livres e os demais poderiam ser escravizados. Mas, Alexandre discordou porque ele admirava a habilidade organizacional dos persas. E em vez de exercer seu poder sobre eles preferiu governar com eles, insistindo para que seus líderes adotassem os costumes locais. E deu maior exemplo ao vestir-se com as roupas típicas nativas, pois, isso era apenas parte de sua tática.
A esclarecida estratégia de Alexandre para aquisições e fusões significava que esses novos territórios poderiam manter aquilo que lhes era mais caro: – sua cultura e sua identidade separadas. As fusões de culturas organizacionais tão diferentes é tão importante hoje em dia quanto era há 2000 anos. Sendo assim, harmonizá-las numa fusão é muito mais importante que consolidar balanços financeiros e combinar instalações industriais.
A biografia de Plutarco sobre Alexandre, o Grande, lembra que é preciso tomar cuidado ao se provocar a assimilação de diferentes culturas numa fusão. Se a combinação não ocorre, as tensões resultantes impedem as sinergias (economias de escala, transferência de tecnologia, pesquisas mais eficientes, etc.)
O senso comum diz que uma das coisas que separa os bons administradores dos simples competidores é a habilidade de tomar decisões rápidas e agir com presteza. É a mitologia da liderança que celebra o caminho mais rápido em tudo, implorando que os líderes pensem, decidam e ajam rapidamente.
Sobre o autor: Julio Cesar S. Santos Professor, Consultor e Palestrante. Articulista de Vários Jornais no RJ, autor dos seguintes livros: “Promoção e Merchandising Eficientes Para Pequenas Empresas” e “Vendedor Profissional” (Ed. Aprenda Fácil); “Qualidade no Atendimento ao Cliente” e “Liderança, Atitude e Comportamento Gerencial (Ed. Clube de Autores); “Estratégia: o Jogo Nas Empresas” e “Planejamento de Vendas” (AGBook Editora) e Co-Autor de “Trabalho e Vida Pessoal – 50 Contos Selecionados” (Ed. Qualytimark, Rio de Janeiro, 2001).Por mais de 25 anos treinou equipes de Atendentes, Supervisores e Gerentes de Vendas, Marketing e Administração em empresas multinacionais de bens de consumo e de serviços.Elaborou o curso de “Gestão Empresarial” e atualmente ministra palestras e treinamentos presenciais e à distância nas áreas de Marketing, Administração, Técnicas de Atendimento ao Cliente, Secretariado e Recursos Humanos.Graduado em Administração de Empresas, Especialista (MBA) em Marketing e Mestre em Gestão Empresarial.
E-mail de contato: jcss_sc@yahoo.com.br / profigestao@yahoo.com.br – Site: www.profigestaoblog.blogspot.com
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Sou a Marina Da Silva, gostei muito do seu artigo tem
muito conteúdo de valor parabéns nota 10 gostei muito.
Olá Hegler…..Agradeço sua participação e, devo dizer ao amigo que eu também passei por um processo parecido, pois a empresa que trabalhava foi adquirida pelo principal concorrente. Realmente a cultura enraizada nessa nova administração era frontalmente contrária à forma de gestão da empresa adquirida e, certamente, todo o departamento comercial (comigo dentro) foi demitido de uma só vez…..É doloroso, mas é uma consequência natural de uma visão / missão que às vezes pode ser vitoriosa e, em outros casos (como foi o meu), pode ser derrotada………Obrigado pelos comentários……Um abraço
Bom dia Prof. Júlio Cesar,
Concordo com o que foi escrito, pois vivenciei e ainda vivencio o que foi descrito neste texto. A minha empresa adquiriu a unidade que trabalho a quase 15 anos e somente a cerca de 4 anos é que foi possível iniciar um processo mais ousado de fusão de culturas. Para que isso fosse possível, cerca de 80% da liderança geral da unidade teve que ser trocada por pessoas mais alinhadas com a visão da empresa. A cerca de 8 anos, a empresa adquiriu outra operação no exterior e está iniciando o processo de adequação de pessoal somente agora. Com isso, fica claro que o processo de fusão de culturas diferentes é demorado, trabalhoso e em alguns casos até doloroso para quem fica. Talvez seja por isso, que Maquiavel não considera esta opção, mesmo porque quanto maior forem as empresas envolvidas, maior será a dificuldade de se conseguir realizar esta transição.
Abraço
Hegler