Publicado em 29/06/2016
RESUMO
Este artigo trata de aspetos referentes ao gerenciamento de projetos e contratos de obras públicas, discutindo aspectos delicados e alternativas para o setor. São abordadas ainda as dificuldades encontradas tanto pelo gerente de projetos da executora, da contratada, quando da contratante, o órgão público.
Fonte: pixabay
INTRODUÇÃO
A Lei das Licitações, 8666/93, estabelece que todos os contratos com o setor público devem ser executados na modalidade Fixed Price (preço fixo), prática para contratação de serviços comumente utilizada também em negociações entre empresas privadas, desde que a tríade escopo, prazo e custo sejam bem detalhados. A famosa definição do PMBoK (Project Management Body of Knowledge) diz que “Um projeto é um esforço temporário empreendido para criar um produto, serviço ou resultado exclusivo”, ou seja, todo projeto é único e inédito, consequentemente dúvidas inerentes ao escopo, custo e prazo são prováveis e desconhecidas.
DESENVOLVIMENTO
Com essas duas definições, observas-se que o papel do contratado, em especial o do gerente de projetos, inicia-se então com uma pecularidade dificilmente encontrada em contratos entre empresas privadas: a quase impossibilidade, ou até mesmo a ilegalidade, na alteração do escopo, custo ou prazo na execução de um projeto inédito. Clovis Magalhães, ex-secretário de Gestão e Acompanhamento Estratégico da Prefeitura de Porto Alegre, definiu, em poucas palavras, durante o 3º Congresso Brasileiro de Gerenciamento de Projetos: “O setor privado pode fazer tudo que a lei permitir. Já o setor público deve fazer o que a lei determina.”
Segundo o professor Artur Alexandre Rodrigues a obrigatoriedade da contratação em Preço Fixo pelas entidades públicas “reduz bastante a flexibilidade e dilata o cronograma do empreendimento, pois exige que o contratante especifique detalhadamente o produto, e nem sempre o órgão público possui as competências técnicas necessárias para esta tarefa”.
Ainda que a lei aceite, dependendo da natureza do contrato, um aditiamento contratual de até 25% ou 50% do seu valor inicial, este artificio deve ser postergado ao máximo, e até evitado, devido especialmente ao gerenciamento das partes interessadas do projeto, ou seja, o impacto e o esforço necessário para a diseminação, conhecimento e aprovação dos inúmeros sujeitos envolvidos em um eventual aditivo contratual.
Entre as diferenças relativas a um contrato público e um realizado entre empresas privadas, existe ainda o objetivo principal no projeto, enquanto o setor privado executa um contrato com a intenção de aumento na lucratividade, no setor público teoricamente enseja-se um serviço de qualidade e atendimento às necessidades da sociedade, ainda que, conforme Farnham e Horton (1992), “é mais comum colocar os objetivos políticos em primeiro lugar do que propriamente os interesses da sociedade”.
Farnham e Horton (1992) afirmam ainda que “é fundamental conhecer a realidade e as características peculiares do setor, para só então partir para a implementação”, ou seja, além das tradicionais técnicas de gerenciamento de projeto e stakeholders, deve ser levada em consideração as intenções políticas e socio-econômicas do projeto, ainda não que estejam claras e os pontos não sejam levantados pela contratante.
Além dos fatores supra-citados, outros pontos diferenciam os projetos públicos e o seu gerenciamento, dentre eles estão: A obrigatoriedade, por lei, da previsão dos recursos para sua execução, os objetivos sociais, políticos e educativos, as estruturas hierárquicas, a análise de viabilidade e execução por técnicos de outras áreas (câmara dos vereadores, por exemplo), mudanças na estrutura administrativa na troca de governo, cobranças subjetivas por parte da sociedade, burocracia excessiva etc.
Estes entraves acabam impactando a execução dos projeto, como mostra um levantamento feito pela consultoria Inter.B apontando que os principais projetos nas áreas de transporte, energia e saneamento do PAC demoram, em média, o dobro do previsto, gerando um grande custo adicional ao estado.
Dentre os desafios do gerente de projetos nos contratos públicos é necessária uma atenção especial às partes interessadas, com foco e tratamento diferenciado às partes que torcem para o fracasso do projeto, citam-se os adversários políticos e os impactados negativamente pelo empreendimento ou serviço, que tendem a procurar atrasos ou alterações para desqualificar, dificultar e até cancelar o contrato.
Porém vários órgãos e esferas governamentais estão investindo na maturidade dos seus projetos e tratativas com os stakeholders, dando suporte aos gerentes de projetos externos e internos e, em alguns casos, implementando escritórios de PMO, possibilitando a criação de metodologias padronizadas para o plano de governo, onde um conjunto de projetos tendem a caminhar na mesma direção e no mesmo pacote de investimento, criando vários programas de projetos e possibilitando o compartilhamento de recursos e, consequentemente, a redução de gastos.
Logicamente a máquina pública ainda não atingiu a maturidade encontrada nas melhores empresas privadas, em especial devido ao fator descontinuidade administrativa, onde a cultura brasileira mantem, de um modo geral, o foco majoritário na política, renovando os cargos técnicos e gerenciais com a troca de governo e a utilização de projetos estratégicos como bancada de apoio político, com pouco comprometimento com os objetivos antes seguidos.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Não existe uma solução simples ou uma padronização para o Gerenciamento de Projetos no Setor Público, o próprio PMI publicou um “Guia PMBOK® e sua Extensão para Governo (Government Extension to the PMBOK Guide)” com metodologias e diretrizes aplicáveis a projetos de governo, no intúito de auxiliar os Gerentes de Projetos a entender a dinâmica diferenciada com esse setor.
Tem-se como princípio de que todos as partes envolvidas buscam o sucesso do projeto dentro do prazo, escopo e orçamento inicial, além da otimização dos gastos públicos e melhoria na prestação dos serviços aos contribuintes, para isso fazem-se necessárias mudanças culturais, partindo do comprometimento dos governantes com os objetivos do estado, das cobranças e acusações subjetivas, além da flexibilização e atualização nas leis que regem as licitações.
A implantação de um PMO (Project Management Office) permanente e obrigatório em orgãos públicos seria capaz de reduzir gastos, otimizar recursos e investimentos e criar um gigantesco banco de dados de lições apreendidas além da possibilidade de esclarecer a população quais os objetivos que o país está buscando, tentando reduzir a constante mudança de foco a cada troca de governo.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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- BANDEIRA DE MELLO, Celso Antônio. Curso de direito administrativo. 22. ed. rev. e atual. até a Emenda Constitucional 53, de 19.12.2006. São Paulo: Malheiros, 2007.
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- MUKAI, Toshio. Contratos públicos: as prerrogativas da administração e os direitos das empresas contratadas, segundo as leis n. 8.666/93 e 8.883/94. São Paulo: Forense Universitária, 1995.
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- FARNHAM, D.; HORTON, S. Managing the new public services. London: Macmillan, 1992.
- OLIVEIRA, O.J.; MELHADO, S. B. O papel do projeto em empreendimentos públicos: Dificuldades e possibilidades em relação à qualidade. São Paulo: PUC-SP, 2001
Sobre o Colunista: Gustavo Uchoa Araripe Andrade, profissional especialista em Gerenciamento de Projetos pela Fundação Getúlio Vargas, com certificação PMP, Diploma em Management pela Faculdade Martin College – Austrália, Engenheiro de Segurança do Trabalho e Engenheiro de Produção pela UNIFOR. Diretor de projetos da QHZ Engenharia Consultiva Ltda e da LMA Consultoria, Projetos e Engenharia Ltda. Com 14 anos de atuação na área e foco em gerenciamento de projetos de infraestruturas de grande porte, experiência em clientes privados e públicos, planejamento, detalhamento de escopo e gerência de stakeholders.
E-mail de contato: gustavouchoa@gmail.com
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