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Contratos justos para ambientes conflituosos

Publicado em 23/12/2016

O que o trabalho vencedor do Nobel de Economia 2016 nos ensina para a Gestão das Aquisições em Projetos.

Remunerar adequadamente um fornecedor, bônus justos para diretores de empresas, remuneração adequada para novos e antigos funcionários, todos são exemplos de contratos entre duas ou mais partes. O paper “Contract Theory”, apresentado para concorrer ao Prêmio Nobel de Economia, nem era o mais cogitado. Surpresa para os pesquisadores e professores Oliver Hart (Harvard) e Bengt Holmström (MIT), que tiveram suas pesquisas reconhecidas com o prêmio máximo, anos e anos de estudos se demonstraram fundamentais para onde chegaram.

“Graças à pesquisa de Oliver Hart e Bengt Holmström, temos agora os instrumentos para analisar não apenas os termos financeiros dos contratos, mas também a prestação contratual dos direitos de controle, de propriedade e de decisão entre as partes”, segundo nota divulgada pela Academia Real de Ciências.

Vencedores Hart e Holmström – The Guardian

“Quando os economistas falam em contratos, geralmente estão indo muito além de uma pilha de papéis para rubricar; estão se referindo a regras que podem ter efeitos muito diferentes no produto ou serviço resultante”, observa o economista Cláudio Lucinda, da Faculdade de Economia e Administração da Universidade de São Paulo, campus de Ribeirão Preto.

“Um eterno obstáculo para a cooperação humana é que as pessoas têm interesses diferentes. Em sociedades modernas, conflitos de interesse são frequentemente mitigados – se não completamente resolvidos – por meio de arranjos contratuais. ”, trecho em livre tradução do trabalho apresentado à comissão julgadora do Prêmio.

A Academia Real de Ciências apresentou a escolha da seguinte forma: um framework compreensivo para analisar diversos problemas no arranjo contratual, aplicado em remuneração a altos executivos por desempenho, franquias de seguro e a privatização das atividades do setor público.

O professor Holmström, da Finlândia, desenvolveu pesquisa para design ótimo de contratos entre empregados e empregador. Típico trabalho da área de “principal-agent problem”. Aplicado na ciência política e economia, (também conhecido como dilema agência ou teoria da agência) ocorre quando uma pessoa ou entidade (o “agente”) é capaz de tomar decisões em nome de, ou do impacto, uma outra pessoa ou entidade: p “principal”.  Este dilema existe em circunstâncias em que o agente está motivado para agir em seus próprios interesses, que são contrários aos do principal, e é um exemplo de risco moral.

Imagem 1 – Problema do Agente Principal

Para resolver isso, o professor do MIT sugere compartilhar riscos. Um exemplo é a empresa quando reduz custos, distribui mais lucro entre os trabalhadores. O trabalho de pesquisa demonstra como se chegar a um pagamento ótimo, sem prejudicar interesses ou conflitos morais, ligado ao desempenho do sistema trabalhador-trabalho.

Já o professor britânico Oliver Hart, tem sua pesquisa substancialmente focada na ideia da incompletude dos contratos. Para ele, nem todos os elementos de um contrato podem ser especificados. Diante disso, o que poderia ocorrer se um evento inesperado ocorresse e não tivesse sido bem declarado nos acordos do contrato? Isso vai significar que uma decisão correta será importante, terá mais vantagem quem tiver mais direitos na tomada de decisão.

Com esses estudos os dois providenciaram uma metodologia capaz de analisar e tornar palpável esses dilemas e assim buscar a solução mais justa para problemas graves na relação entre empresas. Principalmente após a crise econômica de 2008, onde muitas informações estavam sendo escondidas por altos executivos, em prol de seus bônus, o framework da Teoria dos Contratos, traz uma luz e um direcionamento mais objetivo para termos mais cuidados no presente e futuro.

A seguir algumas ideias dos professores apresentadas em seu paper ganhador do Nobel:

  1. Teoria dos Contratos é originária desde os anos de 1700, quando Adam Smith questionou sobre contratos e posses de terra. Em 1930 a teoria foi revistada por Chester Barnard (americano, empresário), onde foi esclarecido como os funcionários colocam mais esforços em grandes empresas. Banard é considerado o autor pioneiro da teoria organizancional.
  2. A teoria dos contratos foca a dificuldade de tentar pagar por desempenho. Uma empresa pode pagar a um CEO baseado no aumento do valor das ações, mas isso poderá estar sendo apenas sorte e não esforço de altos executivos. No final dos anos 70 e início dos 80, o trabalho do Holmström no Prncípio da Informatividade, ajudando a desenvolver modelos de desempenho que contrabalanceariam fatores externos além do controle dos gerentes.
  3. Também foca incentivos e o problema que gerentes priorizam ganhos rápidos sobre a estabilidade (ou não) futura. Nos anos 90, Holmström desenvolve o Modelo Multitarefa providenciando um caminho para medir este efeito.
  4. O modelo tem sido expandido para capturar riscos morais da equipe de trabalho, onde alguns membros poderiam pular o trabalho duro, deixando para outros, bem como no futuro preocupações com a carreira poderiam motivar alguns a correr mais ou menos riscos, como o contrato atual com seu contratante sugere.
  5. Oliver Hart, como dito, tem seu trabalho direcionado a compreender os completos incompletos, ou melhor, como não existem cláusulas para cobrir tudo, como isso afeta relacionamentos atuais e direitos de propriedade.
  6. A teoria diz que quase todos os contratos são incompletos uma vez que o desempenho é difícil de medir precisamente. Se é possível medir desempenho, tornaria o contrato complexo.
  7. Seu trabalho tem sido aplicado em estudos de conflito de interesses entre empresas, acionistas e alta administração, e o direito dos investidores quando da falência das instituições.
  8. O trabalho é importante e vastas aplicações. Olha o que a Academia diz: … gera hipóteses precisas que podem ser confrontadas com dados empíricos e baseadas na fundação intelectual de diversas instituições, várias políticas, da legislação de falência até constituições de politicas de compliance.

Em se tratando sobre Gestão de Projetos, mais especificamente Aquisições, a obra vencedora do Nobel traz as seguintes reflexões:

Pleitos: como contratos têm cláusulas incompletas, é necessário prever contingência e procedimento para tratar aditivos, reivindicações, claims.

Desempenho dos recursos humanos: incentivos e bônus precisam ser estabelecidos de forma a não serem corruptíveis e estabelecerem cláusulas de retenção de valores, aguardando o período de garantia do projeto passar.

Relacionamento com fornecedores: também relacionado com desempenho, os contrato precisam ser claros e regras próprias, com vezes a beneficiar bons fornecedores que realmente fazerem além do que se esperava deles.

Compartilhar riscos: vale para Pleito, Recursos Humanos e Fornecedores: os contratos precisam tornar isso mais claro e com procedimentos e regras eficientes para medir o desempenho do trabalho, sem torna-los complexos demais.

O Nobel de Economia foi criado apenas em 1968 por iniciativa do Banco Central da Suécia (Sveriges Riksbank, que dá nome ao prêmio), diferentemente das categorias de Química, Medicina, Física, Literatura e Paz, instituídas em 1900. Hart e Holmström dividirão 8 milhões de coroas suecas (cerca de R$ 3 milhões).

Fontes:

Sobre o colunista:

Ítalo Coutinho, MSc., Engenheiro, PMP. Graduado em Engenharia Industrial Mecânica, Especialista em Gestão de Projetos e Mestre em Administração de Empresas. Atua como Gerente de Projetos e Engenharia da Saletto Engenharia. Pós Graduado em Logística Empresarial. Coordenador e Professor de Cursos de Pós nas áreas de Engenharia de Planejamento, Gestão de Projetos de Construção e Montagem e Engenharia de Custos e Orçamentos. Autor de capítulos de livros, artigos e colunista sobre Gerenciamento de Projetos, com foco em Engenharia e Construção. Fundador do portal PMKB – Project Management Base of Knowledge. Afiliado a Sociedade Mineira de Engenheiros (SME); PMI; AACE e IBAPE-MG. Revisor do “PMBOK Construction Extension 2015” a convite do PMI Global. E-mail de contato: italoazeredo@gmail.com

Se você tem comentários, sugestões ou alguma dúvida que gostaria de esclarecer, aproveite o espaço a seguir.

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  1. Guilherme Ricardo E F Pedrosa - IEC PUC Minas OF18 disse:

    A pesquisa ganhadora do Nobel partiu de um significado mais abrangente de contrato, que o retira de uma funcionalidade meramente burocrática e restrita. A utilização dos resultados de pesquisas outrora realizadas, mostra que contratos configuram instrumentos que podem incidir diretamente no serviço ou produto final, visto que tudo que passa pelas relações interpessoais é passível do conflito de interesses inerentes às interações sociais. Assim, através de um documento contratual, podem ser previstas e, portanto, resolvidas sem litígios maiores. Para garantia desse sucesso, foi percebido que a estrutura das empresas deve ser estudada mais profundamente, de forma que as relações contratuais se estabeleçam pautadas em uma simbiose justa entre ganhos e investimentos (estruturais, cognitivos e físicos). A premiação foi justa e a contribuição para o campo inegável, visto que Oliver Hart, ainda foi além, ponderando que nem todos os aspectos podem ser previstos num contrato. Desta forma, na hipótese de um evento inesperado, cujo fluxo não esteja contemplado nos termos do contrato, obviamente a vantagem maior será de quem resguardar mais direitos na tomada de decisão. Buscando remediar essa brecha, Hart e o professor Holmstrom (o qual já havia apontado em sua pesquisa para design a teoria da agência, em que também foi mostrado um dilema oriundo de circunstâncias em que o agente, motivado por agir em interesses próprios contrários aos do principal, exemplifica nitidamente um caso de risco moral) desenvolveram uma metodologia capaz de analisar e tornar mais palpáveis os dilemas, buscando soluções mais justas para os problemas graves nas relações entre empresas. O resultado, nessa pesquisa, foi uma expansão de extrema qualidade na compreensão e modelos contratuais, além de uma reflexão profunda e necessária sob os aspectos relativos à Gestão de Projetos. Em especial, Aquisições.

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