Publicado em 23/02/2017
Gestão de Projetos de Engenharia: você aprendeu o que é Gestão, mas e Projetos de Engenharia, o que você sabe sobre eles?
Temos experimentado no mercado nacional (e até mundial), já há alguns anos, um “boom” do Gerenciamento de Projetos (GP). Esta área de atuação profissional surgiu com um destaque enorme e merecido. Seu desenvolvimento é instigante e excepcionalmente fértil para inovações gerenciais. O Gerenciamento de Projetos já é a menina dos olhos da gestão há algum tempo.
Esse “boom” inevitavelmente chamou a atenção de um grande número de profissionais e rapidamente multiplicaram-se no mercado os cursos de formação em GP. Junto com estes cursos e com o desenvolvimento da área, vieram as certificações e a corrida para obter as credenciais mais valorizadas do mercado. Temos hoje um sem número de cursos e profissionais certificados em Gerenciamento de Projetos nas mais diversas empresas e setores do mercado. Até mesmo o setor público e o Terceiro Setor aderiram a essa corrente.
O Gerenciamento de Projeto é conhecimento quase que obrigatório para qualquer profissional hoje em dia. E com razão…
Mas nem tudo são flores… É possível observar que esse boom desviou a atenção de alguns outros conhecimentos tão importantes quanto o Gerenciamento de Projetos. Quando o foco de luz está sobre o ator principal da peça, poucos reparam o que ocorre no fundo do palco. O aquecimento da corrida dos profissionais para o GP resfriou a corrida para outras formações.
Hoje podemos perceber nos grupos de trabalho, muita gente com algum conhecimento em GP e a escassez de pessoal com conhecimento sólido em “não GP”. É algo como ter gente que sabe o que deve ser feito, mas não ter quem saiba fazer o que deve ser feito.
Com a disseminação de cursos e treinamentos em GP surgiu a concorrência entre eles e, então, a necessidade de diferenciação se instaurou, como era previsível. Começaram a surgir os cursos de GP disso e GP daquilo. Também começaram a surgir cursos de Gerenciamento de “Outras Coisas” que sabidamente são projetos. Ao buscar a diferenciação com base nas especificidades de áreas ou projetos passamos a atingir mercados e grupos mais especialistas, porém dando-lhes ainda uma formação gerencial em GP. Afinal, agregamos ao conteúdo de GP (que continua sendo a base da formação), alguns tópicos mais focados em setores específicos.
Um caso me chama a atenção em particular (afinal é minha área de atuação profissional): o caso dos Projetos de Engenharia. Envolvido na corrente do Gerenciamento de Projetos, o termo projeto passou a ser utilizado quase que exclusivamente para designar o conceito utilizado no GP. Nesta ótica podemos admitir que Projeto de Engenharia é praticamente sinônimo de Empreendimento. Num uso ainda mais restrito e comumente encontrado hoje, Projeto de Engenharia é um Empreendimento em Construção Civil.
Não que esta forma de entender os termos esteja equivocada, mas é preciso resgatar o fato de que ela não é a única e, aliás, nem é a primeira historicamente. Antes do boom do GP, quando se falava em Projeto de Engenharia pensava-se nos documentos produzidos por Arquitetos e Engenheiros “representativos” de um empreendimento (as aspas são para destacar uma simplificação do entendimento). Na indústria, também antes do boom do GP, Projeto de Engenharia era o projeto do produto (podendo englobar o processo produtivo). Atualmente, até mesmo na construção civil fala-se de Projeto do Produto, mas não há como evitar o uso da expressão Projeto de Engenharia porque Plano de Engenharia é uma expressão que não é usada (embora seja até compreensível).
Esta distinção do uso do termo projeto é explorada num outro texto: Projeto Processo e Projeto Produto.
Enfim, hoje disponibilizamos aos profissionais diversos cursos de Gerenciamento em diversas áreas. No que se refere a Projetos de Engenharia, dispomos no mercado de uma infinidade de cursos sobre Gerenciamento de Projetos, Gerenciamento de Empreendimentos, Gerenciamento de Obras e até Gestão de Projetos de Engenharia. Contudo, nenhum destes cursos aprofunda no Desenvolvimento de Projetos de Engenharia entendidos com o significado tradicional. Mais que isso, boa parte deles nem sequer levanta essa questão ou essa diferenciação.
Pior do que não tratar desse tema (essa distinção) é o fato de que ao não o fazer (e nem mesmo é feito nas graduações) estamos, na prática, ensinando aos novatos que isso não existe ou que não deva ser foco de preocupação. Estamos secundarizando na prática os Projetos de Engenharia (no entendimento tradicional), embora continuemos fazendo discursos sobre a importância deles. Ora, todos nós sabemos que educamos mais pelo exemplo que pelo discurso.
Talvez essa seja uma das causas das críticas que sofremos frequentemente com relação à incapacidade da Engenharia Nacional. Ofendemo-nos com as críticas, mas na prática talvez não estejamos de fato dando a devida atenção à Engenharia Nacional, porque aprendemos hoje como gerenciar os empreendimentos, mas poucos aprendem de fato a produzir os Projetos (Planos) de Engenharia para os empreendimentos. Aliás, de modo geral replicamos o sofisma de que Projeto de Engenharia é apenas o próprio empreendimento e não mais do que isso.
Projeto de Engenharia na linguagem cotidiana deixou de significar um produto extremamente tangível e cujo processo produtivo envolve formulações extremamente complexas. O conhecimento associado ao Processo de Desenvolvimento do Projeto, que há muitos anos já foi extirpado das grades curriculares das graduações, agora vem sendo esquecido também nas pós-graduações. E há muito que disseminar sobre esse conhecimento até mesmo para entender que para desenvolver engenharia num nível de eficácia elevado é preciso mais que conhecimento técnico especializado, é preciso dominar esse processo de produção. E isso não se resume à gestão do empreendimento, é preciso aprofundar e pôr a mão na massa.
Sobre o Colunista:
Renê Guimarães Ruggeri. Formado em Engenharia Civil, MBA em Gestão de Projetos, Especialista em Gestão de Empresas, 20 anos como Coordenador de Projetos AEC, autor dos livros “Redescobrindo o Processo do Projeto” (2015) e “Gerenciamento de Projetos no Terceiro Setor” (2011), Eng. Máster Coordenador de Projetos na Vale S/A (2011-2015), Professor da Academia Militar de MG no CFOBM (2003-2010), Diretor de Projetos da FEOP(2006-2008), participação em mais de 100 Projetos AEC de variados portes e tipologias (1995-2015), Instrutor, palestrante e escritor nas áreas de Engenharia de Projetos e Gestão de Projetos. Atualmente é Sócio-Proprietário da Renê Ruggeri Engenharia e Consultoria e atua com Gestão de Empreendimentos com foco em Gestão de Engenharia. Email de contato: rgruggeri@gmail.com – Site: www.reneruggeri.com
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