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Projetos Complexos: uma abordagem prática

Publicado em 02/03/2018

Introdução

O conceito de complexidade é bem resumido nos dois parágrafos a seguir, extraídos da Wikipédia na internet.

“Segundo Edgar Morin (Introdução ao Pensamento Complexo, 1991:17/19): “À primeira vista, a complexidade (complexus: o que é tecido em conjunto) é um tecido de constituintes heterogêneos inseparavelmente associados: coloca o paradoxo do uno e do múltiplo. Na segunda abordagem, a complexidade é efetivamente o tecido de acontecimentos, ações, interações, retroações, determinações, acasos, que constituem o nosso mundo fenomenal. Mas então a complexidade apresenta-se com os traços inquietantes da confusão, do inextricável, da desordem, da ambiguidade, da incerteza… Daí a necessidade, para o conhecimento, de pôr ordem nos fenômenos ao rejeitar a desordem, de afastar o incerto, isto é, de selecionar os elementos de ordem e de certeza, de retirar a ambiguidade, de clarificar, de distinguir, de hierarquizar… Mas tais operações, necessárias à inteligibilidade, correm o risco de a tornar cega se eliminarem os outros caracteres do complexus; e efetivamente, como o indiquei, elas tornam-nos cegos.”

(http://pt.wikipedia.org/wiki/Complexidade#Epistemologia_da_complexidade).

Um sistema constitui-se de partes interdependentes entre si, que interagem e tranformam-se mutuamente, desse modo o sistema não será definível pela soma de suas partes, mas por uma propriedade que emerge deste seu funcionamento. O estudo em separado de cada parte do sistema não levará ao entendimento do todo, esta lógica se contrapõe ao método cartesiano analítico que postulava justamente ao contrário.

(http://pt.wikipedia.org/wiki/Complexidade#Epistemologia_da_complexidade).”

Portanto, com base nestes conceitos, projetos complexos seriam projetos com características tais que dificultassem sobremaneira a sua subdivisão sem perdas importantes. Ou seja, são projetos que demandam uma gestão fortemente focada nas interfaces dos produtos gerados (sejam eles produtos concretos ou serviços) sem perder a atenção da condução de cada produto individualmente.

Identificando a complexidade

A complexidade em um projeto pode ser detectada através de vários indícios tais como: elevado número de produtos diferentes, necessidade de uso simultâneo de várias tecnologias, elevado número de partes interessadas, necessidade de conhecimentos técnicos especializados, etc. Todas essas características, direta ou indiretamente, tornam mais preocupantes as interações entre as diversas atividades do projeto. Desde a própria execução física das tarefas, passando pelas necessidades de comunicações (geração e distribuição de informações), até a verificação do atendimento a requisitos do projeto, tornam-se mais trabalhosas e eventualmente demandam técnicas, ferramentas ou habilidades mais avançadas ou apropriadas da equipe de gestão do projeto.

Assim, para identificar a complexidade em um projeto é preciso avaliar, além do seu conteúdo explícito nas documentações técnicas de produtos, composição das equipes e procedimentos técnicos e gerenciais, etc., também as inter-relações e interdependências de cada um destes componentes, avaliando o grau de importância que essas interações possuem no sentido de influenciar as possibilidades de se atingir o objetivo de projeto.

Porém, pode-se argumentar que todo projeto possui essas características em maior ou menor grau. Afinal, grande parte de projetos possui inúmeras partes interessadas, gera uma série de resultados, demanda conhecimento técnico da área de aplicação e possui procedimentos gerenciais bem definidos.

Sim, isso é verdade, mas aqui surge um aspecto prático que altera substancialmente a situação. Trata-se da previsibilidade do projeto, do grau de certeza, do domínio sobre essas características. Ou seja, trata-se da experiência das equipes em conduzir tais situações.

Por exemplo: organizar uma viagem à Europa para mim (que nunca fui à Europa), é muito mais complexo que para uma amiga minha que, além de trabalhar no ramo de turismo, já esteve na Europa a passeio umas 3 ou 4 vezes. Onde está a diferença neste caso? No conhecimento técnico especializado (conhecimento do mercado de turismo), na experiência (ela já esteve lá), na rede de relacionamentos (acesso a informações), etc.

Ou seja, a complexidade se estabelece não apenas pela existência dos fatores que a compõe, mas, sobretudo pelo desconhecimento ou inexperiência sobre como se lidar com eles. Qualquer projeto que lide com áreas de aplicação com a qual não se tem experiência torna-se complexo por ter suas interfaces obscurecidas pela inexperiência (do ponto de vista técnico ou gerencial).

Casos de complexidade

Alguns exemplos de projetos são comuns de apresentarem graus de complexidade importantes.

O caso de implantação de empreendimentos que exigem conhecimento em mais de uma (às vezes três ou quatro) área de aplicação. Esses projetos costumam envolver equipes diversas elevando o número de partes interessadas. Cada parte possui terminologia e costumes peculiares à sua área de aplicação tornando as comunicações bem mais difíceis. O grau de interação ou interdependência entre os produtos em cada área pode ser crucial aos objetivos do projeto. E assim, por diante.

Projetos que possuam restrições importantes em seus procedimentos possuem gargalos fundamentais nas interações entre seus produtos ou partes interessadas. Por exemplo, procedimentos rigorosos de aquisições (comuns com recursos públicos) quando associados a demandas e procedimentos técnicos pouco previsíveis (comuns nas áreas de pesquisa ou em projetos pioneiros) criam situações extremamente complexas de se gerir, agregando questões jurídicas e fiscais.

Projetos de alta tecnologia, além dos riscos comuns de desatualização, impõem uma necessidade de preparação técnica, uma vez que são normais os casos em que as equipes não possuem conhecimento compatível com a necessidade tecnológica e suas interações passam a ter pontos de desentendimento em razão disso.

Enfim, vários são os casos de projetos que podem apresentar características de complexidade.

Tomemos, como exemplo prático, o projeto de implantação de um museu na área de saúde, em um edifício histórico tombado com alto grau de deterioração, com utilização de recursos financeiros públicos e que contemple um elevado uso de tecnologias modernas de informação e comunicação na exposição. Avaliemos a complexidade deste empreendimento.

A princípio a própria definição da área de aplicação do projeto pode gerar dúvidas. Trata-se se um projeto na área de saúde, de construção civil, de patrimônio histórico, de museologia ou de tecnologia da informação? Obviamente todas estas áreas são pertinentes ao empreendimento e são importantes para se atingir o objetivo. Uma exímia restauração do prédio não garante qualidade da exposição que depende fundamentalmente de informações e conhecimentos na área de saúde, de tecnologias da informação e comunicação e museologia.

Não é difícil imaginar a variedade de profissionais e equipes envolvidas: profissionais de saúde de várias áreas, arquitetos, engenheiros, designers, museólogos, historiadores, gestores de órgãos públicos financiadores, etc.

Subdividir o projeto em vários subprojetos é possível, mas a interdependência entre eles seria um ponto importante de atenção. Como exemplo, citemos que o conteúdo de cada elemento de exposição a ser definido por uma equipe mista de museólogos e profissionais de saúde precisará de uma forma de exposição a ser trabalhada pelos profissionais das áreas de design e tecnologia que, por sua vez, demandarão sistemas prediais do pessoal da engenharia cuja implantação depende dos critérios de preservação patrimonial conduzidos pela equipe de arquitetura e restauração, Essas questões técnicas todas fortemente influenciadas por órgãos de fiscalização do patrimônio, do uso de recursos públicos e pela instituição proprietária do empreendimento.

Obviamente pode-se argumentar que são vários os empreendimentos já implantados com essas características e, por conta disso, esse projeto não teria um grau de complexidade considerável. Então questionaríamos primeiro se o fato de se ter o empreendimento implantado é sinal de que o projeto foi um sucesso? Gastou-se o previsto? O resultado que vemos é o que se queria ou ficou aquém desse? E o prazo, estourou ou não? Etc.

Certamente quem já implantou um empreendimento dessa natureza está mais preparado para implantar outro, mas o projeto continua complexo. Cada caso é um caso, como sabemos bem das teorias de gerenciamento de projetos.

Subprojetos e terceirização em projetos complexos

É comum subdividir grandes projetos em outros menores, os subprojetos, para executá-los por partes ou facilitar o gerenciamento. Esta prática sem dúvida trás bons resultados em inúmeros casos, mas não em todos.

Em projetos complexos, como a interdependências entre suas partes é bastante expressiva, dividir o projeto pode implicar em dificultar essa interação e consequentemente dificultar o desempenho do projeto (uma vez que o objetivo depende da interdependência das partes). Se as partes forem terceirizadas, o que é comum, a coisa pode complicar-se ainda mais, pois não se tem o grau de ação num terceiro igual ao que se tem com equipes próprias. Além disso, mudanças, mesmo que pequenas, provocadas durante a interação entre as partes (terceiros) podem acabar por gerar um sem número de solicitações de aditivos contratuais.

Enfim, a divisão de projetos complexos em subprojetos é possível, mas a gestão das interfaces entre esses subprojetos será sempre um foco de preocupação fundamental do gestor do projeto. Mecanismos administrativos normalmente usados em grandes projetos podem não funcionar em projetos complexos, podendo inclusive piorar a situação de controle do projeto.

É importante lembrar que projetos complexos não são necessariamente projetos grandes e vice-versa. Vale à pena ressaltar também que projetos complexos, por menores que sejam, estão mais próximos de conceito de projetos caóticos que os projetos grandes. Ou seja, tratar projetos complexos sem as devidas precauções gerenciais pode alterar sua situação e colocar em risco o seu objetivo.

Gerenciando projetos complexos

Gerenciar projetos complexos então implica em conduzir sua execução com especial atenção às diversas interfaces existentes. Ou seja, por mais que se possam delegar partes do projeto a outras equipes, as relações entre elas são foco intransferível da atenção do gerente do projeto complexo.

Uma vez que a gestão tem um dos seus pilares nas interfaces entre resultados e equipes, é de se esperar que a gestão das comunicações assuma papel ainda mais fundamental no sistema de gestão do projeto. Este sistema, planejado e conduzido pelo gerente do projeto, deve considerar as dificuldades de comunicação existentes no projeto complexo tais como: diferenças de terminologia, diferenças de prazos para geração e tratamento de informações em cada área, dispersão geográfica da equipe (é de se esperar que as equipes de cada área tenham suas necessidades de espaço físico independente), etc.

Além dos cuidados especiais com a comunicação, projetos complexos demandam normalmente equipes tecnicamente bem preparadas e multidisciplinares. Assim, o gerente do projeto deve compor seu staff com atenção para que não lhe falte opinião técnica nas áreas de aplicação que não são do seu domínio. Afinal, em projetos complexos é extremamente improvável que o gerente do projeto tenha formação técnica em todas as áreas de aplicação envolvidas.

O monitoramento dos riscos do projeto deve também ser tratada com especial atenção. Os riscos oriundos das interações entre as partes do projeto são perfeitamente administráveis se forem detectados em tempo. Como a interação entre as partes de um projeto complexo é intensa, um equívoco cometido em uma definição ou atividade rapidamente se espalha pelo projeto podendo provocar novos equívocos em todas as partes interagidas.

Conclusão

Portanto, projetos complexos exigem conhecimento técnico e gerencial especializados, atenção focada nas interfaces e objetivos e, sobretudo, consciência dos pontos de complexidade do projeto por parte da equipe de gestão.

Dessa forma, organizações que se deparam com projetos complexos, se não possuem as condições necessárias para sua execução, devem procurar parceria com outras organizações a fim de suprir suas deficiências. Essas parcerias podem ser construídas de diversas maneiras. O mais indicado é que estas organizações deleguem a execução do projeto a uma outra organização de consultoria mais especializada nas áreas envolvidas no projeto ou busquem conveniar-se com estas organizações especializadas de modo a mobilizar uma equipe capacitada para a condução do projeto.

Um fato parece ser inquestionável: dificilmente uma organização cujo foco não é a gestão de projetos, estaria preparada para gerir projetos complexos.

Sobre o Colunista: 

Renê Guimarães Ruggeri, Formado em Engenharia Civil, MBA em Gestão de Projetos, Especialista em Gestão de Empresas, 20 anos como Coordenador de Projetos AEC, autor dos livros “Redescobrindo o Processo do Projeto” (2015) e “Gerenciamento de Projetos no Terceiro Setor” (2011), Eng. Máster Coordenador de Projetos na Vale S/A (2011-2015), Professor da Academia Militar de MG no CFOBM (2003-2010), Diretor de Projetos da FEOP(2006-2008), participação em mais de 100 Projetos AEC de variados portes e tipologias (1995-2015), Instrutor, palestrante e escritor nas áreas de Engenharia de Projetos e Gestão de Projetos. Atualmente é Sócio-Proprietário da Renê Ruggeri Engenharia e Consultoria e atua com Gestão de Empreendimentos com foco em Gestão de Engenharia. E-mail de contato: rgruggeri@gmail.com – Site: www.reneruggeri.com

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