Publicado em 10/03/2014
Ser ou não ser um especialista técnico? Eis a questão – final
Nessa semana, para completar essa série de três artigos, vou expor a minha opinião sobre esse tema polêmico – os profissionais envolvidos com o gerenciamento de projetos devem, ou não, ser especialistas técnicos? Minha intensão é apresentar a minha opinião e os principais argumentos que a sustente.
Em primeiro lugar devemos analisar duas dimensões que influenciam muito na necessidade dos profissionais envolvidos com o gerenciamento de projetos serem especialistas técnicos, ou não: o tamanho e complexidade do projeto (ou organização); e o nível de maturidade em gerenciamento de projetos da organização.
Quando consideramos o tamanho e complexidade de um projeto, ou de uma organização, a necessidade do conhecimento técnico do Gerente de Projeto é inversamente proporcional ao seu tamanho. Na maioria das vezes, um projeto pequeno, desenvolvido numa organização de pequeno porte, tem um orçamento restrito que impacta diretamente no tamanho da equipe que atuará na sua execução. Nesses casos, o gerenciamento do projeto é executado por um profissional sênior, que tenha experiência para isso, que acaba acumulando algumas funções que, em projetos maiores e mais complexos, são executadas por pessoas diferentes. Por exemplo, em um projeto de construção ou reforma residencial, o Gerente do Projeto pode ser o engenheiro responsável pela obra, que acumula essa função; em um projeto de lançamento de um novo produto, o Gerente do Projeto pode ser o Gerente da família de Produtos da qual o lançamento fará parte.
Em contra partida, em projetos grandes e complexos, que envolvam várias disciplinas e especialidades distintas, como os projetos de construção industrial ou de infraestrutura, ou o lançamento internacional de uma linha de produtos, as equipes são maiores e mais especializadas, e as atividades e necessidades de gerenciamento, mais complexas e em maior quantidade. Nesses casos, é importante que a equipe de gerenciamento tenha pleno domínio das técnicas, processos e ferramentas de gerenciamento, garantindo através de sua aplicação, o sucesso do projeto. Grandes projetos têm escopos complexos e orçamentos vultosos, que permitem a formação de uma equipe de especialistas em todas as disciplinas, inclusive em gerenciamento. A equipe de gerenciamento deve ser formada por profissionais que detenham o conhecimento e a experiência necessária para gerenciar o projeto, deixando os aspectos técnicos sob a responsabilidade das equipes especialistas de cada disciplina.
Alguns colegas argumentam que, quanto maior for a complexidade do projeto, maior a necessidade do Gerente de Projetos ser especialista. Particularmente, discordo dessa posição. Além dos argumentos apresentados acima, posso acrescentar que, nesses casos, a especialidade do profissional tem pouco impacto no seu desempenho como Gerente de Projetos, pois sua especialidade técnica será em apenas uma das disciplinas envolvidas no desenvolvimento do projeto. Por exemplo, um Gerente de Projetos especialista em automação, tem o mesmo nível de especialidade em construção civil que um analista de sistemas. Vale ressaltar que estamos falando em especialidade técnica e não em experiência e conhecimento prático. Além disso, esse profissional fica à mercê de ser influenciado pela Síndrome do Gerente de Projetos Especialista, que apresento a seguir nesse artigo.
Quando analisamos do ponto de vista do nível de maturidade em Gestão de Projetos da organização, a necessidade de conhecimento técnico, em detrimento do conhecimento em gestão, do Gerente de Projetos é diretamente proporcional à maturidade da organização. Em outras palavras, quanto menos madura for a organização menos conhecimento técnico o Gerente de Projetos precisa ter, e mais conhecimento e experiência em gerenciamento ele deve ter. Explico! Numa organização com pouca maturidade em gerenciamento os profissionais envolvidos na execução do projeto não têm muito conhecimento e experiência em gestão, além da própria estrutura organizacional não favorecer o desenvolvimento do projeto. Nesses casos, é muito importante que o Gerente do Projeto tenha uma sólida experiência em gestão, independente da sua especialidade técnica, que lhe garanta as condições para gerenciar o projeto com sucesso. Numa empresa madura, o conhecimento e experiência da equipe de gestão e a própria estrutura organizacional, facilitam o desenvolvimento do projeto o que pode absorver uma eventual falta de experiência em gerenciamento de um especialista técnico que eventualmente assuma a posição de Gerente do Projeto. Não estou afirmando que o Gerente do Projeto deva ser mais técnico em organizações mais maduras, estou apenas avaliando que o impacto da eventual falta de experiência em projetos é menor em empresas mais maduras, onde os processos e os profissionais garantem o desempenho da gestão.
Além dessas duas dimensões, devemos analisar o próprio comportamento do profissional e avaliar duas situações perigosas para o sucesso do projeto, que costumo chamar de: a Síndrome do Gerente de Projetos Especialista; e a Síndrome do Planejador Autossuficiente.
A Síndrome do Gerente de Projetos Especialista acontece, e eu já vi acontecer em vários projetos dos quais participei, quando o gerente de projetos, que é especialista em uma disciplina, se envolve nas soluções técnicas associadas à sua especialidade. Nesse momento, ele deixa de focar suas atividades de gerenciamento e passa a ser mais um especialista técnico no projeto. Essa síndrome é extremamente prejudicial ao andamento do projeto, que perde o seu Gerente – o maestro que deve determinar o tom e o ritmo dos trabalhos a serem executados. Imagine uma orquestra em que o maestro abandona seu posto e passa a tocar um dos instrumentos de sua preferência. A tendência dessa síndrome se manifestar é tão maior quanto for a experiência e a especialidade técnica do profissional, e exige que ele tenha um alto nível de maturidade em gerenciamento para evitá-la.
Já a Síndrome do Planejador Autossuficiente ocorre quando os profissionais de planejamento envolvidos no projeto são tão especialistas no assunto que tendem a fazer todo o planejamento do projeto sozinhos. O Planejamento de um projeto é uma atividade iterativa que tem como resultado um modelo que define como o projeto deve ser executado para atingir seus objetivos de escopo, custos, prazos e qualidade. Para garantir o sucesso do projeto, toda a equipe deve ser envolvida no seu planejamento, dando sua contribuição. A melhor forma de obter o comprometimento da equipe na execução do projeto é envolvê-la no seu planejamento, desde seu início. Quando temos um Planejador Autossuficiente, ele tende a desenvolver todo o planejamento sozinho, sem envolver a equipe. Nesses casos, conquistar o comprometimento é muito mais difícil e o planejamento tende a não ser perseguido como meta do projeto. Mais uma vez, é necessária maturidade em gerenciamento desse profissional, para evitar que essa síndrome se manifeste.
Quando sou responsável pela formação de uma equipe para o gerenciamento de um projeto e tenho que escolher entre um profissional especialista técnico, com pouca experiência em gestão, ou um especialista em gestão que não tem conhecimento técnico na área do projeto, eu tendo a escolher o especialista em gestão! Deixo a especialidade e a responsabilidade técnica para a equipe de profissionais especialistas.
Concluindo, acredito que os profissionais envolvidos com o gerenciamento de projetos precisam ter conhecimento, habilidades e experiência nos processos de gerenciamento. Não é uma condição limitante a falta da especialidade técnica no assunto objeto do projeto. Por outro lado, se a especialidade existir e o profissional tiver uma maturidade para evitar as síndromes discutidas anteriormente, será um fator que poderá contribuir para o seu desempenho.
Eu sei que depois de ler esse artigo, você pode rever suas ideias e concordar comigo. Ou pode discordar totalmente do que escrevi aqui. Seja como for, te convido a fazer seus comentários e expor suas ideias, enriquecendo o conhecimento de todos!
Uma ótima semana a todos!
Sobre o Colunista: Alexandre Zoppa, PMP, SpP, com mais de 15 anos de experiência em gerenciamento, é engenheiro eletrônico formado pela Escola de Engenharia Mauá, pós-graduado em Administração de Empresas pela FAAP e com aperfeiçoamento em Gerenciamento de Projetos pela George Washington University. É instrutor em Gerenciamento de Projetos e colunista do PMKB. Hoje atua como coordenador de planejamento Arcadis Logos. Já foi PMO na Ambev e Líder de Planejamento na ABB S.A., entre outras.
E-mail de contato: alexandrezoppa@yahoo.com.br;
Se você tem comentários, sugestões ou alguma dúvida que gostaria de esclarecer, aproveite o espaço a seguir.
Odair,
Você tem toda razão. A formação da equipe é um ponto chave para o sucesso do Projeto. O GP deve analisar todas as necessidades, gaps e alternativas e montar sua equipe com os profissionais que possuam as características, conhecimentos e experiências necessárias – sejam elas técnicas ou de gestão – para garantir um bom andamento do projeto.
Abraço e muito obrigado pelo seu comentário!
Concordo que o GP tem que ter experiência em Gestão, mas a composição da Equipe no caso de Empreendimentos tem que ter especialistas técnicos.