Publicado em 21/04/2020
Entender que em tudo que fazemos na nossa vida existem riscos parece difícil, à princípio. Se pensarmos na nossa condição de seres humanos, o que nos garante a supremacia diante de outros animais, sem sombra de dúvidas é o nosso poder de escolha. Isso é o que nos permite bater no peito diante de um pássaro e dizer “eu sou livre… você não”. E somos livres porque, diferente de um sabiá, não somos reféns de nossa natureza e exatamente por este motivo, nós nos permitimos transgredir. Porém, junto com essas escolhas, vêm também as consequências. Quando escolhemos utilizar um garfo ao invés de uma colher para comer farinha, temos que ter a consciência de que seremos menos eficientes na quantidade de farinha ingerida em cada garfada, mas a escolha é sua. Você pode escolher ir ao trabalho de carro ou de bicicleta, porém há uma coisa que você deverá sempre considerar seja qual for a sua escolha: cada modal tem suas vantagens e desvantagens. E é exatamente neste momento em que você se depara com os riscos embutidos em cada uma das suas escolhas.
No momento em que estamos trabalhando no planejamento de nossos projetos todas as partes interessadas estão com suas cabeças a mil. Todos criam e expõem suas expectativas relacionadas ao resultado de cada projeto. E enfim, depois de listarmos uma série de requisitos, vamos modelando o escopo e o fragmentando em partes menores nas quais regularmente chamamos de atividades (ou tarefas, ou entregas, etc…). Tudo muito bem, tudo muito bom… até que chega a hora em que um cara “negativista” (mais conhecido entre as pessoas que não entendem as práticas de GP como Gerente de Projetos) faz a clássica pergunta:
“Então pessoal, vamos agora elencar os riscos relacionados a cada uma dessas atividades e planejar as devidas tratativas?”
Não se espante se um súbito silêncio acompanhado de um certo ar de descontentamento chegar a você nesse momento. Algumas pessoas simplesmente não dão a mínima para o gerenciamento de riscos em um projeto porque simplesmente acham que não tem como dar errado. Porém tem uma coisa muito importante que eu preciso te contar: algumas das partes interessadas de um projeto não sabem que existem riscos atrelados às atividades definidas, cabe ao Gerente de Projetos externar a importância de proceder com este tipo de tratativa. É o GP quem precisa convencer às pessoas sobre a necessidade de gerenciamento dos riscos de um projeto. Geralmente essa análise é feita com o apoio dos envolvidos, porém nem sempre isso vai acontecer. Em muitos casos, infelizmente, por falta de interesse dessas pessoas no gerenciamento dos riscos, você terá que fazer essa análise sozinho e posteriormente apresentar o resultado.
Mas o que fazer para conseguir este engajamento das partes interessadas no planejamento do gerenciamento dos riscos em nossos projetos? Antes de mais nada, não existe uma ferramenta para isso. Mas o raciocínio lógico que sempre uso para tentar convencer os envolvidos a de fato se envolverem no gerenciamento dos riscos é aquele que apontei lá no início do artigo: o caminho de casa para o trabalho.
Digamos que você irá começar um projeto intitulado “CONTRATO ASSINADO“. O produto desse projeto é um contrato assinado por um importante cliente. Porém este contrato só será assinado no término de uma reunião com os diretores da empresa contratante. Também vamos considerar que uma das tarefas desse projeto é Ir ao Escritório. Obviamente essa tarefa está no caminho crítico, tem uma relação de dependência e vínculo do tipo Término-a-Início, o que quer dizer que a próxima tarefa só será iniciada após o término dessa. Ao elencar os riscos embutidos nesta tarefa, devemos também considerar que você precisa estar no cliente às 8h da manhã. Podemos assim montar um raciocínio:
1. Preciso escolher como irei da minha casa para o escritório do cliente fechar este contrato de modo que eu chegue no horário marcado. Se eu escolher ir de carro, o que poderia acontecer?
- Há um risco do trânsito estar muito complicado, sem rotas alternativas, ocasionando atraso;
[Probabilidade: Alta | Impacto: Muito Alto] - O carro pode quebrar no caminho, o que atrasaria consideravelmente a sua chegada no cliente;
[Probabilidade: Baixa | Impacto: Muito Alto] - O local onde fica o escritório do cliente pode não contar com estacionamento;
[Probabilidade: Média| Impacto: Alto]
Estratégia de Resposta aos Riscos: Uma boa forma de mitigar esses riscos é sair mais cedo que o habitual e ir para o escritório do cliente de Táxi. Com isso, você evita o horário de pico do trânsito. Se o Táxi quebrar, pode solicitar outro e seguir seu trajeto e não precisará ficar rodando por um local de estacionamento, o que lhe poupará tempo e aumentará significativamente suas chances de chegar no horário marcado.
Avaliação dos Custos: As melhores práticas nos diz que, antes de fecharmos o orçamento de um projeto, é preciso avaliarmos os riscos para que possamos calcular possíveis contingenciamentos. Obviamente se você fosse de carro o custo seria com combustível e estacionamento rotativo (considerando que não houvesse nenhum risco). Nós já vimos que os riscos existem, mas imagine se ninguém considerasse esses riscos? Qual seria o impacto nos custos desta atividade? De cara, já podemos ter uma boa ideia.
- Se o carro quebrar? Custo com reboque: em média R$ 250,00
- Se ficar muito tempo no trânsito? Custo com combustível: acréscimo de 20% no valor do combustível gasto.
- E qual seria o custo com o atraso se tudo isso acontecer realmente? Dependendo do cliente, pode custar o próprio contrato.
O exemplo é muito simples e óbvio, meramente ilustrativo. Porém fica claro que, se os riscos causam impacto nas pequenas coisas do dia-a-dia, imagina em atividades complexas nos projetos em que nós todos atuamos. O grande problema para quem gerencia projetos é que boa parte das ações contidas na estratégia de resposta aos riscos depende de outras pessoas, outras áreas, incluindo a alta gestão. Quando essas partes interessadas simplesmente negligenciam a necessidade de agir sobre os riscos, a única coisa que você, como GP, pode fazer e tentar apagar os incêndios que virão (e não tenha dúvidas que virão). Como profissionais não nos cabe levantar o braço e dizer “eu avisei”, até porque isso não vai adiantar, mas é muito importante que todos tenham consciência de que as tratativas das quais temos o dever de fazer, sejam realmente feitas.
Por isso que eu sempre digo essa frase a todos os colegas de profissão: Tente não gerenciar os riscos do seu projeto e veja o que acontece.
Sobre o autor:
Wagner Borba – Digital Mobility Assoc Manager na Accenture. Graduado em Tecnologia da Informação pela UNIFG/Laureate International Universities (PE) e MBA em Gestão de Projetos pela Universidade Estácio de Sá (RJ). Possui certificações Project Management Professional (PMP®) pelo PMI, Certified Scrum Master (CSM®) pela Scrum Alliance, ITIL® Foundation pela OGC-UK, International Product Owner Foundation (IPOF) pela Scrum Association e Lean Six Sigma Yellow Belt (SSYB). Detém 8 anos de experiência em gerenciamento de projetos nas áreas de Desenvolvimento de Software, Telecomunicações, Infraestrutura e Outsoucing de TI em empresas nacionais e multinacionais como Accenture, Huawei Technologies, Alcatel-Lucent e Isolux Corsan, atuando em projetos de alta complexidade, tendo como clientes as principais operadoras de telefonia do país, montadoras de veículos, holdings de bens de consumo, redes de hospitais, grupos educacionais, universidades, indústrias e órgãos de todas as esferas de governo (municipais, estaduais e federais). Criador do MEsP (Mapa Estratégico Pessoal) e do método 4D-STK para Gerenciamento de Stakeholders. Foi Diretor de Administração e Finanças do PMI Pernambuco Chapter na gestão 2016/2017 e colunista em editoriais sobre gerenciamento de projetos.Email de contato: wagner.borba@pmipe.org.br/ wborbaconsultoria@gmail.com. Site: http://escopodefinido.com
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