Project Management Knowledge Base – Conhecimento e Experiência em Gerenciamento de Projetos

Clique Aqui para uma busca avançada.

Estratégias para lidar com riscos impossíveis de identificar

Publicado em 03/08/2017

O gerenciamento de riscos é um dos aspectos essenciais no planejamento e na execução de qualquer tipo de projeto. Gerir um projeto sem um método adequado de gerenciamento de riscos é uma temeridade.  O Guia PMBOK (Project Management Body of Knowledge) em sua 5ª edição define os seguintes passos para o gerenciamento de riscos em projetos:

  1. Planejamento do gerenciamento de riscos;
  2. Identificação de riscos;
  3. Análise qualitativa dos riscos;
  4. Análise quantitativa dos riscos;
  5. Planejar resposta aos riscos; e
  6. Controlar riscos;

Apesar da enorme importância do processo sugerido pelo Guia PMBOK, o fato é que esse método tradicional de gerenciamento lida apenas com riscos previsíveis, riscos residuais e riscos secundários, cuja definição está colocada a seguir:

  • Risco previsível: é aquele que é possível de ser identificado ou pela experiência dos profissionais envolvidos ou por um histórico de ocorrência de riscos em projetos anteriores.
  • Risco residual: é aquele que existe mesmo após termos implementado a resposta ao risco.
  • Risco secundário: é aquele que surge em decorrência da implementação de uma resposta ao risco.

Além desses três tipos, existem também os riscos que não passíveis de identificação. São os riscos para os quais não temos a menor pista de que eles existem. A literatura cientifica de gerenciamento de projetos na língua inglesa costuma chamar esse tipo de risco de Unknown Unknown (A tradução é algo como riscos desconhecidos que não sabemos que não conhecemos). Esses riscos costumam ser os mais problemáticos. Mas de onde surgem esses riscos desconhecidos e que são impossíveis de serem identificados previamente? A origem desses riscos normalmente está ligada a dois tipos de fatores:

  1. Fatores influenciadores impossíveis de serem identificados e que geram riscos e;
  2. Fatores influenciadores conhecidos que interagem fortemente entre si, de tal forma que essas interações criam uma dinâmica própria cujo resultado é impossível de prever.

Existem duas estratégias principais para lidar com riscos dessa natureza: o aprendizado através do processo de tentativa e erro, do selecionismo darwiniano e através de uma estratégia híbrida que envolve ambas as estratégias anteriores. As explicações dessas estratégias em termos bem simples são as seguintes:

Estratégia de tentativa e erro

Essa estratégia envolve fazer experimentos que possam trazer a melhor solução possível. Em cada teste, os resultados são registrados e analisados com a finalidade de gerar lições aprendidas que possam melhorar a execução do projeto. O uso desse tipo de estratégia é adequado quando as condições de melhoria obtidas num determinado teste não vão mudar no próximo teste.  Esse tipo de estratégia envolve os seguintes passos:

  • Passo 1 – A experimentação da solução deve propiciar o máximo o grau de aprendizagem possível;
  • Passo 2 – O processo de experimentação deve ser feito mesmo que envolva um certo grau de improvisação. A ideia não é obter resultados perfeitos. A ideia é obter insights que possam fazer com que a solução ideal seja enxergada;
  • Passo 3 – Analisar os resultados para fazer as melhorias necessárias;
  • Passo 4 – Melhorar os processos executivos com base nas lições aprendidas e usar a experiência obtida para desenhar o próximo experimento de forma mais efetiva; e
  • Passo 5 – Retornar ao passo 1 e refazer este ciclo quantas vezes for necessário até que se alcance a solução ideal.

Vamos a um exemplo prático para ilustrar o conceito dessa estratégia. Suponha que seu projeto envolva a fabricação e montagem de diversas comportas de controle do fluxo de água em um vertedouro numa usina hidrelétrica. Existem vários fatores que podem interagir entre si e criar uma situação de avanço muito abaixo daquilo que estava planejado. Esses fatores podem envolver, por exemplo, riscos nas seguintes áreas:

  • No projeto de engenharia das comportas feito pela empresa projetista e pela engenharia do proprietário.
  • Nos fornecedores de matéria prima para as comportas.
  • Nos componentes fabricados por subfornecedores.
  • Na fabricação das comportas.
  • Na interação entre a fiscalização do proprietário e a equipe do fabricante.
  • No transporte das peças até o canteiro de obras
  • Na pré-montagem na oficina do canteiro
  • Na logística interna de transporte de peças do canteiro de obras até o vertedouro da usina.
  • Na montagem das peças das comportas no vertedouro da usina
  • Na interação entre a equipe da empreiteira de montagem e a fiscalização.
  • Na interação entre equipes de montagem mecânica das comportas com outras equipes que disputam espaço no local de montagem.
  • Na operação e manutenção dos equipamentos envolvidos.

Embora seja possível prever os riscos e as respostas para esses riscos em cada um dos aspectos citados, é bem mais difícil prever os riscos que podem ocorrer por conta da interação simultânea entre os diversos fatores e atores envolvidos. Nesse caso a experimentação por tentativa e erro, com lições aprendidas reaplicadas às atividades pode minimizar ou evitar problemas, é uma estratégia interessante. Se, por exemplo, na montagem da primeira comporta entregue ocorrerem problemas de soldas com falhas, é possível fazer experimentos com outros processos de solda até que seja possível resolver o problema nas peças que ainda não foram montadas. Esse processo de experimentação por tentativa e erro leva a uma diminuição paulatina das incertezas na execução das demais comportas a serem fabricadas e montadas. O principal problema dessa estratégia envolve o trade-off entre:

  1. Fazer experimentação e correr o risco de o projeto não progredir conforme desejado por conta do tempo perdido em tentativas e erros ou;
  2. Não fazer experimentações e o projeto não progredir por conta de riscos que vão surgindo sem que possa ter uma resposta para esses riscos.

Selecionismo Darwiniano

O selecionismo darwiniano é usado em situações complexas nas quais a melhoria num aspecto piora outro aspecto que também é importante para o projeto. Vamos a um exemplo: quando a indústria farmacêutica desenvolve o projeto de uma nova molécula para uso em um novo medicamento, a interação entre diversos fatores pode fazer com que os resultados sejam imprevisíveis. Uma certa molécula pode criar condições de cura de um tumor num determinado órgão do corpo e, ao mesmo tempo, criar danos em vários outros órgãos. Nesse caso o problema envolve múltiplas dimensões que tornam difícil saber qual é a melhor solução. Num problema desse tipo, a solução média, ou seja, aquela que cria menos danos pode não ser satisfatória. O medicamento na formulação X, que é o menos causa danos no organismo, pode não resolver o problema fundamental que é curar a doença. Na literatura cientifica em inglês, esse tipo de problema é chamado de wicked problem (Problema perverso).  Nesse caso o selecionismo é a alternativa disponível para buscar minimizar a incerteza de ocorrência dos riscos do projeto. O processo de seleção darwiniana funciona da seguinte forma:

  1. Definir as restrições e os critérios de aceitação da solução. Essas restrições e critérios devem ser continuamente revistos ao longo do desenvolvimento dos trabalhos.
  2. Desenvolver experimentações em paralelo para que se possa encontrar uma intersecção aceitável no conjunto de possíveis soluções. A ideia aqui é buscar soluções que possam ser aplicadas de forma sucessiva em diferentes conjuntos de combinações de restrições. Observe que esse processo, da mesma forma como no processo anterior de tentativa e erro, também envolve experimentações. Mas, no método de seleção darwiniana, as diversas experimentações são feitas em paralelo por equipes que buscam a melhor solução possível entre diversos fatores que competem entre si. No exemplo da hidrelétrica, colocado anteriormente, a melhoria num processo de solda na fábrica, por exemplo, não vai afetar o desempenho no transporte e da montagem das peças em campo ou vice-versa. Mas no caso do desenvolvimento de um medicamento, a melhoria da eficácia no combate à doença pode criar outra doença em outra parte do corpo.
  3. Confirmar que uma determinada solução é factível antes de se comprometer com a escolha dessa solução.
  4. Eliminar as soluções que não contribuíram para o avanço do projeto. O nome de selecionismo darwiniano vem exatamente do fato de que as soluções que não se mostram promissoras são simplesmente descartadas. A única coisa que não é descartada são as lições aprendidas que podem ser úteis para melhorar a chance de encontrar a solução ideal nos outros experimentos. Mesmo que um experimento falhe, ele pode trazer lições aprendidas preciosas.

Obviamente o maior problema nesse tipo de estratégia envolve a resposta as seguintes perguntas essenciais:

  • Quantas tentativas de experimentação em paralelo devem ser feitas?
  • Quando se deve parar com as experimentações?
  • A solução encontrada é efetiva, ou seja, ela resolve o problema sem criar outros problemas impossíveis de serem resolvidos?

Infelizmente não há uma receita certa aqui. O máximo que se pode dizer é que quanto mais complexo é um problema, maior deve ser o número de tentativas. Mas é evidente que o número de tentativas é limitado à capacidade da organização executora do projeto em fazê-las por conta das limitações de recursos e de tempo.

Conclusão

O presente artigo definiu que existem riscos que são desconhecidos e cuja existência pode ser impossível de ser identificada. São os chamados Unknown Unknown (ou problemas perversos) que a literatura cientifica de gerenciamento de projetos coloca. Foi explicado que esse tipo de risco ocorre ou por fatores influenciadores impossíveis de serem identificados e que geram riscos ou por fatores influenciadores conhecidos que interagem fortemente entre si e criam uma dinâmica própria cujo resultado é impossível de prever. Por fim, o artigo trouxe duas possíveis estratégias de como lidar com esses riscos.

 

Sobre o Autor:

Álvaro Antônio Bueno de Camargo, é consultor, palestrante e autor. Possui 37 anos de experiência na área de gerenciamento de projetos e negócios, com atuação internacional em projetos e cursos nos Estados Unidos, Japão, Angola, Argentina e Colômbia. É Mestre em administração de empresas pela Universidade Presbiteriana Mackenzie, com foco de pesquisa em capacidades dinâmicas e gerenciamento de projetos e MBA em Administração de Projetos pela Fundação Instituto de Administração da USP. É graduado em Ciências da Computação pela Universidade Paulista e é certificado como PMP – Project Management Professional pelo Project Management Institute. Atuou em projetos de grande porte nas áreas de energia, indústria, petroquímica e outras. É palestrante, autor de livros e artigos científicos. É docente dos cursos de MBA na Fundação Getúlio Vargas no Brasil e no exterior. Também ministra aulas em cursos de pós-graduação na UNICAMP, na Universidade Federal de São Carlos e na FECS – Faculdade de Educação em Ciências da Saúde do Hospital Oswaldo Cruz.  E-mail de contato: camargo.alvaro@gmail.com.

Se você tem comentários, sugestões ou alguma dúvida que gostaria de esclarecer, aproveite o espaço a seguir.

Imprimir

Ainda não recebemos comentários. Seja o primeiro a deixar sua opinião.

Deixe uma resposta

Li e concordo com a Política de Privacidade

Compartilhe:

Av. Prudente de Morais, 840 Conjunto 404

++55(31) 3267-0949

contato@pmkb.com.br

Seg á Sex de 09hrs á 18hrs

×